A Lei de Tortura nos concursos das Carreiras Jurídicas
Está se preparando para concursos de Carreiras Jurídicas? Então se liga nessas dicas nosso professor Rogério Sanches, Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo (MP/SP).
Mantenha seus estudos atualizados referentes à Lei de Tortura (Lei n° 9.455/97).
Início do repúdio à tortura no cenário nacional e internacional
Após a 2ª Guerra Mundial, a tortura começou a ser mundialmente repudiada. Nesse contexto, verificou-se a aprovação de diversas Convenções e Tratados Internacionais de combate à tortura (alguns destes ratificados, inclusive, pelo Brasil).
Entretanto, a preocupação no Brasil constatou-se, de fato, após a promulgação da Constituição Federal de 1988, com a consagração, como direito fundamental, de o cidadão não ser submetido à tortura (artigo 5°, inciso III, da CF/88).
Implicitamente, aludido dispositivo legal espelha mandado constitucional de criminalização da tortura. Além disso, a maioria doutrinária defende que trata-se de garantia absoluta, não comportando exceções.
Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei n° 8.069/90): primeiro diploma a definir o crime de tortura (artigo 233), limitando, contudo, a vítima apenas a criança e adolescente.
Lei n° 8.072: tratou de equiparar a tortura a crimes hediondos (em termos práticos, previu para a tortura as mesmas consequências de um delito hediondo).
Lei de Tortura (Lei n° 9.455/97): definiu a tortura no Brasil, revogando, inclusive, o art. 233 do ECA, para vítimas de qualquer faixa etária (criança, adolescente, adulto ou idoso).
Lei n° 12.847/13: institui o Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura.
Aspectos introdutórios da Lei de Tortura
No Brasil, a Lei de Tortura (Lei n° 9.455/97) destoa dos Tratados Internacionais em dois pontos:
1 – a tortura pode ser praticada por qualquer pessoa, tratando-se de um crime comum, ou seja, não precisa figurar como sujeito ativo agente do Estado (entendimento este já firmado pelos Tribunais Superiores, a exemplo do posicionamento fixado pelo STJ no julgamento do REsp 1.738.244/DF);
2 – de acordo com a legislação pátria, a tortura é prescritível (pois as hipóteses de imprescritibilidade estão previstas na Constituição – art. 5°, incs. XLII e XLIV), contrariando, inclusive, alguns tratados ratificados pelo Brasil nos quais considera-se imprescritível a prática da tortura.
Nesse sentido, duas correntes doutrinárias se insurgem:
i) o Tratado Internacional de Direitos Humanos é ratificado com status de norma infraconstitucional, ainda que supralegal (razão pela qual prevalece a Constituição Federal, segundo a qual a tortura é prescritível);
ii) no conflito entre CF e Tratado Internacional de Direitos Humanos, deve prevalecer a norma mais favorável aos Direitos Humanos (de maneira que prevalece o Tratado e, portanto, a tortura é imprescritível).
Em ocasião semelhante relativa à Lei de Anistia, o STF já chegou a decidir de acordo com a primeira corrente; de outra banda, o STJ adotou, ainda que em uma ação cível de reparação de danos, a segunda corrente. Passemos agora ao estudo das torturas praticadas por ação (artigo 1°, I e II e § 1°, da Lei de Tortura – Lei n° 9.455/97).
Inciso I do artigo 1° (Lei de Tortura – 9.455/97):
~> Crime Bicomum: trata-se de um delito comum quanto ao sujeito ativo e quanto ao sujeito passivo (pode ser praticado/sofrido por qualquer pessoa, independentemente da qualidade ou condição especial do agente).
~> Conduta punida: constrangimento mediante violência ou grave ameaça.
~> Voluntariedade: dolo + fins especiais presentes nas alíneas “a”, “b” e “c”.
Vamos analisar cada uma das alíneas:
a) denominada “tortura prova”
– a exemplo do credor (particular) que tortura devedor para que este confesse a dívida, bem como do policial (agente do Estado) que tortura alguém para confessar a autoria de um crime.
Este crime consuma-se com o constrangimento causador de sofrimento físico/mental (dispensada a obtenção da informação/declaração/confissão desejada, sendo esta mero exaurimento a ser considerado na fixação da pena-base).
Por outro lado, é perfeitamente possível a tentativa, pois trata-se de um crime plurissubsistente.
b) denominada “tortura crime / para a prática criminosa”
(ex: João tortura Antônio para que este mate alguém).
O crime consuma-se com o constrangimento, sendo dispensável a conduta criminosa por parte do torturado. Dessa forma, no exemplo acima citado, mesmo que Antônio não mate ninguém; se, contudo, este último delito se consumar, João responderá tanto pela tortura quanto pelo homicídio praticado por Antônio, na condição de autor mediato (em concurso material).
De igual modo, a tentativa é perfeitamente possível.
Quando o torturador busca do torturado a prática de contravenção penal, duas correntes doutrinárias discutem a aplicação ou não da alínea “b”:
1ª corrente: entende que a expressão “natureza criminosa” contida no tipo compreende também a contravenção penal;
2ª corrente (majoritária): compreende que a expressão abrange somente crime, evitando-se analogia in malam partem.
c) denominada “tortura preconceito / discriminação”
(ex: constranger alguém por ser judeu). O STF entende a expressão “raça” no sentido jurídico e, de acordo com alguns ministros, posicionou-se no sentido de que, enquanto o legislador não criar o tipo específico de homofobia, esta pode ser ajustada em normas que punem o preconceito.
O crime consuma-se com o constrangimento causador de sofrimento físico/mental, sendo a tentativa perfeitamente possível.
Inciso II do artigo 1° (Lei de Tortura – 9.455/97):
Trata da denominada “tortura castigo”, crime consumado com a provocação do intenso sofrimento na vítima (sendo a tentativa perfeitamente possível).
~> Crime Bipróprio: é imprescindível a relação de guarda/poder/autoridade entre os envolvidos, tanto para o sujeito ativo (independentemente de ser agente do Estado, tal como o entendimento do STJ firmado no julgamento do REsp 1.738.264/DF) quanto para o sujeito passivo.
~> Conduta punida: submeter a vítima, mediante violência/grave ameaça, a intenso sofrimento físico/mental. Esse “intenso sofrimento” é elementar do tipo de “tortura castigo”, que o diferencia do delito de maus tratos (art. 136 do CP), de maneira que o juiz analisará, no caso concreto, se existe ou não o intenso sofrimento.
~> Voluntariedade: dolo + fim especial de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.
§ 1° do artigo 1° (Lei de Tortura – 9.455/97):
Trata da denominada “tortura pela tortura”. Diferentemente das outras formas de tortura, aqui o agente não tem nenhuma finalidade especial. O delito consuma-se com a submissão da vítima a sofrimento físico/mental (dispensando o emprego de violência ou grave ameaça), sendo a tentativa perfeitamente possível.
Exemplos: pessoa presa em flagrante e linchada na população; menor infratora apreendida em flagrante e colocada em um presídio masculino.
~> Sujeito Ativo: crime comum (pode ser praticado por qualquer pessoa).
~> Sujeito Passivo: crime próprio, pois só pode ser vítima a pessoa presa (abrangendo tanto a prisão penal – definitiva ou provisória – quanto a prisão extrapenal – a exemplo da prisão civil) ou sujeita a medida de segurança (internação/tratamento ambulatorial). A maioria entende que “pessoa presa” abrange o menor em sistema de internação ou de semi-liberdade.
~> Conduta punida: submeter a vítima (pessoa presa ou sujeita a medida de segurança) a sofrimento físico/mental por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal.
~> Voluntariedade = dolo sem fim especial.
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