O Presidente da República, Jair Bolsonaro, sancionou a Lei 13.874/2019, de 20 de setembro de 2019, que estabelece medidas de desburocratização e simplificação de processos para empresas e empreendedores. A Lei é originada da MP 881/ 2019 e traz impactos em diversos ramos do Direito como o Direito do Trabalho e Direito Civil.
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Impactos no Direito do Trabalho
A lei traz as seguintes alterações e flexibilizações nas leis trabalhistas:
– Carteira de trabalho digital
Inicialmente, vamos ressaltar a primeira modificação acerca da carteira de trabalho digital. As CTPS serão emitidas pelo Ministério da Economia preferencialmente por meio digital, conforme Art. 14 desta lei:
“Art. 14. A CTPS será emitida pelo Ministério da Economia preferencialmente em meio eletrônico.
Parágrafo único. Excepcionalmente, a CTPS poderá ser emitida em meio físico, desde que:
I – nas unidades descentralizadas do Ministério da Economia que forem habilitadas para a emissão;
II – mediante convênio, por órgãos federais, estaduais e municipais da administração direta ou indireta;
III – mediante convênio com serviços notariais e de registro, sem custos para a administração, garantidas as condições de segurança das informações.” (NR)
Por motivos de viabilidade econômica a impressão em papel será exceção e o documento terá como identificação única do empregado o número do CPF.
“Art. 15. Os procedimentos para emissão da CTPS ao interessado serão estabelecidos pelo Ministério da Economia em regulamento próprio, privilegiada a emissão em formato eletrônico.” (NR)
“Art. 16. A CTPS terá como identificação única do empregado o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF).
Outra mudança importante diz respeito ao prazo que os empregadores terão de cinco dias úteis (anteriormente o prazo era de 48 horas), a partir da admissão do trabalhador, para fazer anotações na CTPS.
“Art. 29. O empregador terá o prazo de 5 (cinco) dias úteis para anotar na CTPS, em relação aos trabalhadores que admitir, a data de admissão, a remuneração e as condições especiais, se houver, facultada a adoção de sistema manual, mecânico ou eletrônico, conforme instruções a serem expedidas pelo Ministério da Economia.
6º A comunicação pelo trabalhador do número de inscrição no CPF ao empregador equivale à apresentação da CTPS em meio digital, dispensado o empregador da emissão de recibo.
7º Os registros eletrônicos gerados pelo empregador nos sistemas informatizados da CTPS em meio digital equivalem às anotações a que se refere esta Lei.
8º O trabalhador deverá ter acesso às informações da sua CTPS no prazo de até 48 (quarenta e oito) horas a partir de sua anotação.” (NR)
Além disso, o trabalhador deverá ter acesso às informações em até 48 horas, contadas a partir da inscrição das informações.
– Registro de ponto
A nova lei põe fim a necessidade legal do quadro discriminativo dos horários dos empregados, sendo que a pré-anotação dos períodos de repouso tornou-se mera faculdade e não uma obrigatoriedade.
O registro dos horários de entrada e saída do trabalho passa a ser obrigatório somente para empresas com mais de 20 funcionários (antes eram com mais de 10 empregados). O controle pode ser manual, mecânico ou digital. Ademais, o trabalho fora do estabelecimento deverá ser registrado.
A permissão de registro de ponto por exceção, por meio do qual o trabalhador anota apenas os horários que não coincidam com os regulares. Essa prática deverá ser autorizada por meio de acordo individual ou coletivo.
Assim, o registro por exceção significa que se houver um simples acordo individual escrito entre empregado e empregador ou um acordo coletivo, uma convenção coletiva de trabalho pode ser implementado o registro por exceção.
Por exemplo, José trabalha regularmente de 08:00 às 17:00 horas com uma hora de intervalo, totalizando oito horas diárias não precisa registrar o ponto. Mas caso faça hora extra estas serão registradas, mas o horário regular não seria registrado. Por isso é chamado de registro de ponto por exceção, só registra o que é exceção como as horas extras, as suspensões, interrupções mas o horário regular não seria registrado.
“Art. 74. O horário de trabalho será anotado em registro de empregados.
4º Fica permitida a utilização de registro de ponto por exceção à jornada regular de trabalho, mediante acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho.” (NR)
– Abertura dos bancos aos sábados
Uma outra novidade é que os bancos poderão abrir aos sábados. A MP revoga uma lei de 1962 que extinguia o trabalho aos sábados em bancos, de modo que as agência poderão abrir aos sábados.
– Fim de alvará para atividades de baixo risco
Atividades de baixo risco como a maioria dos pequenos comércios não exigirão mais alvará de funcionamento. O Poder Executivo definirá atividades de baixo risco na ausência de regras estaduais, distritais ou municipais. O Poder Executivo também definirá atividades de baixo risco na ausência de regras estaduais, distritais ou municipais.
– Substituição do e- Social
O Sistema de Escrituração Digital de Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas, que unifica o envio de dados sobre trabalhadores, será substituído por um sistema de informações digitais de obrigações previdenciárias e trabalhistas.
– Desconsideração da personalidade jurídica da empresa
A pessoa jurídica não se confunde com os seus sócios, associados, instituidores ou administradores. Ou seja, a responsabilidade da pessoa jurídica se diferencia da responsabilidade dos sócios e não se confunde a pessoa jurídica com as pessoas físicas.
Por consequência o patrimônio de sócios, associados, instituidores ou administradores de uma empresa não se confunde com o patrimônio da empresa em caso de execução de dívidas.
O objetivo é blindar o patrimônio dos sócios salvo se houver fraude, lesão aos credores, desvio da finalidade da empresa, o patrimônio dos sócios deixa de responder ou não responderá pelas dívidas das respectivas empresas. Cabe ressaltar que precisa provar que houve fraude, não sendo mais presumida. Portanto, somente em casos de intenção clara de fraude, sócios poderão ter patrimônio pessoal usado para indenizações.
A mesma interpretação foi fixada para o grupo econômico, ou seja, pela nova lei a mera existência de grupo econômico não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica para atingir os bens das outras empresas do grupo ou sócios. Salvo se houver abuso da personalidade jurídica em função do desvio de finalidade (fraude com o objetivo de lesar credores e praticar atos ilícitos).
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Impactos no Direito Civil
– Com o veto presidencial ao Art.20, inciso I, a Lei está ou não em vigor?
Este artigo é composto por dois incisos, o inciso I disciplinaria a vacatio legis por 90 dias de um grupo de artigos de lei ali previstos. Já o inciso II disciplina um outro grupo de artigos desta lei e afirma que para esse segundo grupo a lei entra em vigor na data da sua publicação, ou seja, o congresso nacional desejou construir dois prazos distintos de vacatio legis.
No entanto, a Presidência da República vetou o inciso I com a justificativa de que desejava que a lei passasse a vigorar imediatamente na data da sua publicação, observe:
Art. 20. Esta Lei entra em vigor:
I – (VETADO);
II – na data de sua publicação, para os demais artigos.
Razões do veto
“A propositura legislativa, ao estabelecer o prazo de noventa dias para a entrada em vigor dos arts. 6º ao 19 do projeto de lei, contraria o interesse público por prorrogar em demasia a vigência de normas que já estão surtindo efeitos práticos na modernização do registro público de empresas, simplificação dos procedimentos e adoção de soluções tecnológicas para a redução da complexidade, fragmentação e duplicidade de informações, entre outros. Nestes termos, deve prevalecer a norma do inciso II do art. 20, que estabelece a vigência imediata do projeto de lei, na data de sua publicação.”
No entanto, o veto ao inciso I não faz com que a lei entre em vigor imediatamente, mas faz incidir o Art.1° da LINDB, segundo o qual a norma vigorará 45 dias após a data da sua publicação em território nacional e três meses no estrangeiro, pois com o veto não se teve a disciplina na lei de prazo diferente de vacatio, conforme o artigo:
Art. 1o Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco dias depois de oficialmente publicada.
Portanto, de acordo com a doutrina civilista majoritária e entendimento de renomados professores como Roberto Figueiredo a Lei de Liberdade econômica não está em vigor.
– Art.4°, inciso VIII e no Art.5° da Lei de Liberdade Econômica e a repercussão nos profissionais da saúde
Outra questão em debate está no Art.4°, inciso VIII e no Art.5° da Lei de liberdade econômica. O Inciso VIII do Art.4° proíbe a administração pública e as suas agências reguladoras de restringir a publicidade inclusive em normas regulamentares para ao agentes econômicos ou nos setores econômicos. De modo a permitir a máxima publicidade sem qualquer tipo de recessão da administração pública. Dessa forma:
Art. 4º É dever da administração pública e das demais entidades que se vinculam a esta Lei, no exercício de regulamentação de norma pública pertencente à legislação sobre a qual esta Lei versa, exceto se em estrito cumprimento a previsão explícita em lei, evitar o abuso do poder regulatório de maneira a, indevidamente:
VIII – restringir o uso e o exercício da publicidade e propaganda sobre um setor econômico, ressalvadas as hipóteses expressamente vedadas em lei federal;
Isto repercute no campo dos médicos e dos profissionais da medicina, pois o Conselho Federal de Medicina e a Legislação respectiva proíbe os médicos de realizarem propaganda do antes e depois com imagens dos seus pacientes. Diante disso, alguns entendimentos minoritários defendem a tese de que esse artigo teria passado a permitir que os médicos fizessem essa propaganda do antes e depois.
No entanto, este entendimento não merece ser acolhido visto que o texto do Art.4°, VIII se dirige a “setor econômico” e a “agente econômico” e médico não está inserido em nenhum desses termos, pois, este não busca em primeiro lugar o valor econômico mas sim a promoção à saúde. E do contrário ocorreria na mercantilização da saúde, que é vedada expressamente por texto de lei, jurisprudência dos Tribunais superiores, pelo Código de medicina e a Lei do ato médico.
Além disso, conforme o Art.2°, § 2° da LINDB a lei especial prevalece sobre lei geral. Assim, existindo legislação especial no campo da medicina não faria sentido se aplicar uma legislação geral que não foi produzida para médicos para tratar de uma questão específica do ato médico, portanto:
Art. 2o Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue.
§2oA lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.
Ademais, a lei de liberdade econômica não foi construída com vistas a saúde pública ou ao Direito médico mas sim com outra finalidade ligada ao direito econômico e da busca do lucro que não se compatibiliza com os valores deontológicos da medicina.
– Inauguração do Art. 49 –A
Este artigo passou a existir no Código Civil consagrando de maneira ratificada o princípio da autonomia ou independência entre a pessoa jurídica e a pessoa física, demonstrando a preocupação do legislador com a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica. Além de estabelecer maiores restrições e controle para que esta seja mais criteriosa e restrita.
Art. 7º A Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), passa a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 49-A. A pessoa jurídica não se confunde com os seus sócios, associados, instituidores ou administradores.
Parágrafo único. A autonomia patrimonial das pessoas jurídicas é um instrumento lícito de alocação e segregação de riscos, estabelecido pela lei com a finalidade de estimular empreendimentos, para a geração de empregos, tributo, renda e inovação em benefício de todos.”
-Novidade no Art.50
Há uma novidade também no Art. 50 que disciplina a desconsideração da pessoa jurídica admitindo que o patrimônio dos sócios ou administradores sejam utilizados subsidiariamente, mas vai restringir aos bens particulares de administradores ou sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso. Portanto, deve agora se provar para desconsiderar que aquele sócio ou administrador de fato se beneficiou.
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso.
A legislação traz mais restrições a desconsideração e o conceito de desvio de finalidade e confusão patrimonial passa a ser decomposto nos parágrafos do Art.50:
§1º Para os fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza.
§2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato entre os patrimônios, caracterizada por:
I – cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa;
II – transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e
III – outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial.
§3º O disposto no capute nos §§ 1º e 2º deste artigo também se aplica à extensão das obrigações de sócios ou de administradores à pessoa jurídica.
§4º A mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste artigo não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica.
§5º Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica.” (NR)
– Novidade no Art .113
O Art.113 trouxe de novidade os seguintes parágrafos:
Art. 113. ……………………………………………………………………………………………………….
1°A interpretação do negócio jurídico deve lhe atribuir o sentido que:
I – for confirmado pelo comportamento das partes posterior à celebração do negócio;
II – corresponder aos usos, costumes e práticas do mercado relativas ao tipo de negócio;
III – corresponder à boa-fé;
IV – for mais benéfico à parte que não redigiu o dispositivo, se identificável; e
V – corresponder a qual seria a razoável negociação das partes sobre a questão discutida, inferida das demais disposições do negócio e da racionalidade econômica das partes, consideradas as informações disponíveis no momento de sua celebração.
§2º As partes poderão livremente pactuar regras de interpretação, de preenchimento de lacunas e de integração dos negócios jurídicos diversas daquelas previstas em lei.” (NR)
– Novidade do Art.421 e 421 – A
“Art. 421. A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato.
Parágrafo único. Nas relações contratuais privadas, prevalecerão o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual.” (NR)
“Art. 421-A. Os contratos civis e empresariais presumem-se paritários e simétricos até a presença de elementos concretos que justifiquem o afastamento dessa presunção, ressalvados os regimes jurídicos previstos em leis especiais, garantido também que:
I – as partes negociantes poderão estabelecer parâmetros objetivos para a interpretação das cláusulas negociais e de seus pressupostos de revisão ou de resolução;
II – a alocação de riscos definida pelas partes deve ser respeitada e observada; e
III – a revisão contratual somente ocorrerá de maneira excepcional e limitada.”
– Fundos de investimento
É positivado no Código Civil Brasileiro a partir de agora o fundo de investimento. E pela Lei de Liberdade econômica passa a dar natureza jurídica de condomínio especial.
Art. 1.368-C. O fundo de investimento é uma comunhão de recursos, constituído sob a forma de condomínio de natureza especial, destinado à aplicação em ativos financeiros, bens e direitos de qualquer natureza.
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