Entenda o projeto de lei da terceirização aprovado na Câmara
Críticos da proposta enxergam na possibilidade de terceirização da atividade-fim uma abertura generalizada que precarizará uma modalidade de trabalho já fragilizada.
Favoráveis ao texto, no entanto, afirmam que a regulamentação trará segurança jurídica e terá resultados na geração de emprego, razão pela qual o tema ganhou o interesse do Palácio do Planalto.
Enviada ao Congresso em 1998, a proposta já havia sido aprovada pela Câmara e, ao passar pelo Senado, sofreu alterações. De volta à Câmara, o texto aguardava desde 2002 pela análise final dos deputados.
Com informações do G1.
Confira aqui o texto do projeto de lei aprovado na íntegra
Comentários
Sem lei específica, a CLT não previa a terceirização. Quem versava sobre o tema era a Súmula 331 do TST, que autorizava a terceirização da mão de obra em casos excepcionais. Com a aprovação da terceirização nas atividades-meio ou fim e na administração pública, uma escola pode, por exemplo, terceirizar o professor.
Para o professor de Direito do Trabalho do CERS Rafael Tonassi, a consequência a médio e longo prazo pode ser empresas sem nenhum empregado, o que pode diminuir os salários e deixar o empregador mais vulnerável.
“A nossa visão do projeto da terceirização é uma precarização da mão de obra. Antes, tínhamos uma contratação direta, onde todos os direitos e deveres da CLT eram mantidos. A precarização trás uma maior flexibilidade para as indústrias e para o empregador, mas a tendência é uma perda de direito dos empregados. Vamos ter que aguardar o tempo para saber as principais consequências”, afirma.
Sobre a terceirização na administração pública, Tonassi tranquiliza os concurseiros. Ele acredita que não haverá um impacto muito grande, já que as carreiras típicas de estado são protegidas, e nos demais cargos deve haver uma interpretação conforme a constituição.
Confira o comentário completo do professor:
O juiz do Trabalho e professor do CERS Otávio Calvet afirma que a lei ainda precisa ser interpretada pelos princípios constitucionais, a exemplo da isonomia, o que deixa margem para argumentações. Ele também ressalta a distinção entre intermediação de mão de obra (temporário) e a terceirização. Assista ao comentário de Calvet:
O professor e procurador do Trabalho Henrique Correia chama atenção para a terminologia adotada no projeto de lei e a ampliação do prazo do trabalho temporário:
Terminologia adotada na terceirização e no trabalho temporário: O projeto de Lei nº 4.302/1998 adotou terminologia distinta para as partes envolvidas na terceirização e no trabalho temporário. É imprescindível que se memorize as expressões utilizadas para evitar a confusão entre os dois regimes, terceirização e trabalho temporário:
– Trabalho temporário: Há presença de 3 partes na relação jurídica, o trabalhador temporário, a empresa de trabalho temporário (intermediadora de mão de obra temporária) e a empresa tomadora dos serviços.
– Terceirização: Da mesma forma, existe a formação de uma relação jurídica triangular, com trabalhador terceirizado, empresa de prestação de serviços a terceiros e a empresa contratante.
• Diferenças entre a simples intermediação de mão de obra e a terceirização: A intermediação de mão de obra está presente no trabalho temporário. Nela, a empresa prestadora de serviços possibilita que um trabalhador temporário preste serviços em outra empresa, denominada tomadora. Por outro lado, a terceirização compreende a transferência de um serviço ou atividade específico de uma empresa a outra, ou seja, não se busca apenas um trabalhador para substituir outro que entrou em férias, por exemplo, mas, na terceirização, há verdadeira delegação de um setor da empresa para que outra possa atuar com seus próprios empregados terceirizados. Nesse sentido, surge a obrigação de que a empresa de prestação de serviços a terceiros preste serviços determinados e específicos.
• Ampliação do prazo do trabalho temporário: Uma das principais alterações na disciplina do contrato de trabalho temporário consistiu na ampliação do prazo de 3 meses, prorrogáveis por mais 3 ou 6 meses a depender da hipótese contratada, previsto na redação anterior do art. 10 da Lei nº 6.019/1974 para 180 dias, podendo ser prorrogado por até 90 dias, consecutivos ou não. Além disso, em consonância com as recentes decisões do STF e a lei de gorjetas no âmbito da denominada reforma trabalhista, a nova redação do art. 10, § 3º da Lei nº 6.019/1974 possibilita que o prazo de 180 dias seja alterado por meio de acordo ou convenção coletiva. Trata-se da valorização do negociado sobre o legislado, que permitirá que os sindicatos e as empresas negociem prazos superiores para o trabalho temporário. A ampliação do prazo, via instrumento coletivo, é algo prejudicial aos trabalhadores, pois será possível que uma empresa contrate indefinidamente trabalhadores temporários com a prorrogação do prazo mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho.
Confira a análise completa do professor Henrique Correia aqui.
Para Renato Saraiva, de fato, a regulamentação da terceirização é necessária e tem seus benefícios. Todavia, não obstante, representa um retrocesso na garantia dos direitos sociais da classe trabalhadora do país.
"As empresas contratantes ganham mais segurança jurídica, afastando possíveis processos trabalhistas e ampliando o poder de investimento e geração de emprego. A legislação vigente já não atende mais as práticas modernas de produção, e a flexibilidade dos contratos terceirizados supre essa carência. A regulamentação ainda induz a criação de novas empresas especializadas, iguala as condições empresarias à tendência mundial da terceirização, e estimula a responsabilidade social com a maior exigência de fiscalização. Alguns alegarão que os direitos sociais previstos na CF/88 foram preservados. Sim, isso é verdade. Agora, a terceirização, com certeza, inviabilizará os diretos conquistados em negociação coletiva, já que a empresa não precisará seguir, em relação aos trabalhadores terceirizados, a norma coletiva", afirma o professor de Direito do Trabalho.
Ainda segundo Saraiva, considerando que o salário pago aos terceirizados é em média 24% menor do que os empregados contratados diretamente (estudo realizado pelo Dieese), haverá precarização das relações do trabalho com diminuição do custo através das terceirizações. No setor bancário, a diferença é ainda maior: eles ganham em média um terço do salário dos contratados. Segundo o Sindicato dos Bancários de São Paulo, eles não têm participação nos lucros, auxílio-creche e jornada de seis horas. A consequência lógica da regulamentação da terceirização aprovada é a diminuição dos salários dos empregados, pois criou-se um mecanismo para as empresas não respeitarem as normas coletivas que garantem inúmeros direitos e benefícios aos empregados, simplesmente terceirizando sua mão de obra.
Veja também: o professor de Direito Administrativo do CERS Matheus Carvalho também teceu comentários sobre a Terceirização e seus impactos no universo dos concursos. Confira
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