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Dor de amor tem preço?

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Publicado em 08/08/2016, às 08:34

Lendo “Para onde vai o amor?”, do Fabrício Carpinejar, durante o voo de retorno de um curso de pós graduação, em Brasília, deparei-me com uma reflexão que me chamou a atenção: "Eu lhe amei com toda a minha devoção, antecipava voos para ganhar minutos ao seu lado. Eu lhe amei com todas as surpresas que poderia inventar. Eu modificava minha agenda para lhe dar carona. Eu não reclamava de acordar antes para preparar seu café…. Derramei bilhetes pela casa, derramei gérberas pela casa, derramei roupas pela casa. Não tive outra prioridade senão sua felicidade, mesmo que isso custasse minha paz…. E meu amor bonito não é meu, é seu. Não ficou comigo. O amor não é uma propriedade de quem sente, é uma transferência total para quem é amado. Assim como uma carta é de quem lê, não de quem mandou". (p. 144)

A sensibilidade aflorada do escritor gaúcho me fez refletir sobre a tese da indenização entre cônjuges e companheiros pelo término da relação afetiva.

Não tenho dúvidas de que os instrumentos da Responsabilidade Civil incidem nas relações familiares. Uma conduta culposa pode ocasionar um dano em uma relação casamentária ou convivencial, como nos casos de ofensas físicas, injúrias graves, transmissão de doenças venéreas… Aliás, li, na Revista Brasileira de Direito de Família, do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, um texto do talentoso Professor Marcelo Truzzi sobre o tema, expondo esse cabimento, com habitual clareza e sólidos fundamentos, aos quais adiro expressamente.

Todavia, vai ganhando uma convicção ainda maior em mim de que não se pode reparar economicamente o tempo investido na relação afetiva. Não pode prosperar a tese de que a pessoa que dedicou anos (muita vez, décadas…) de sua vida a outra, por opção própria, por amor (sentimento dedicado espontânea e reciprocamente), mereça uma indenização apenas, e tão somente, pelo simples fato de ter cessado o projeto amoroso bilateral. É que o amor, e o desamor, são circunstanciais. Não há garantia de amor eterno. E também não se pode reclamar vícios redibitórios afetivos….

Como dizia uma música infantil, "o anel que tu me destes, era vidro e se quebrou; o amor que tu me tinhas, era pouco e se acabou"….

Por óbvio, reconheço que fatores outros, exógenos ao desamor, podem gerar o dever de reparar danos morais ou matérias, como nas hipóteses de violência doméstica, infelizmente ainda presentes na sociedade. Insisto, porém, que a simples cessação do amor não é suficiente para tanto. Se os projetos de vida, os sonhos futuros, de uma vida a dois naufragaram, não há como se imputar juridicamente culpa, a justificar indenizações.

Culpa de não mais amar? Culpa de se apaixonar por outra pessoa? Culpa de enxergar defeitos onde só existiam virtudes? Culpa de querer uma vida mais feliz e alegre? Culpa de que, finalmente?

Assim como a construção do amor é recíproca, o desamor (o esvaziamento da admiração que uniu o casal) também é alcançado por obra de ambos. Ainda que omissiva, por inércia em atender às expectativas do outro, há uma atuação bilateral!

A verdade é que, quando o véu da paixão (ou o manto da conveniência) não mais encobre defeitos (ou quando cessa a paciência), o final é inexorável! Investir em uma relação amorosa é opção própria e carrega consigo riscos. Até porque amar é arriscado. Por isso, a simples frustração do projeto afetivo não pode servir como motivo de merecimento de indenização. Qual seria o dano? Seria, então, uma espécie de responsabilidade objetiva pelo desamor?

E aquele "serial lover", a pessoa viciada em amor, que mal termina uma relação e já se lança em outra, com uma voracidade sentimental absoluta e a certeza (quase matemática) de que a próxima relação vai dar certo? Este incorrigível repetente da escola do amor incorre em culpa exclusiva da vítima ou culpa concorrente?

O certo é que estar em estado de amor, dedicando vida à tentativa de construção de um projeto com alguém, é o alimento da alma das pessoas. Alguns precisam, inclusive, estar projetando algo em outrem. E, como diz a Marisa Monte (que bem canta as dores do amor), "isso me acalma, me acolhe a alma, isso me ajuda a viver". Como, então, pleitear indenização quando aquela necessidade afetiva (que não era, necessariamente, dúplice) não prosperou?

De todo modo, parece-me necessária uma ética mínima dos envolvidos no momento da ruptura afetiva, com vistas a preservar a própria boa-fé. Não me parece que a perda da vontade de viver juntos seja causa indenizante porque o coração não é apropriável pelo Direito, em condutas obrigatórias.

E como bem percebia a compreensão avançada de Chico Xavier, "embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo, qualquer um pode começar a agora e fazer um novo fim".

O Prof. Cristiano Chaves ministra aulas nos cursos:

CURSO INTENSIVO PARA A DEFENSORIA PÚBLICA ESTADUAL – TEORIA E RESOLUÇÃO DE QUESTÕES OBJETIVAS E SUBJETIVAS + MATÉRIAS COMPLEMENTARES ESTADUAIS + LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL

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