Por maioria, o Plenário do Supremo Tribunal Federal julgou parcialmente procedente a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 291, que questionava a constitucionalidade do artigo 235 do Código Penal Militar (CPM). O Código trata como crime sexual a “pederastia ou outro ato de libidinagem” e estabelece pena de detenção de seis meses a um ano ao “militar que praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso, homossexual ou não, em lugar sujeito a administração militar”.
A Corte declarou como não recepcionados pela Constituição Federal os termos "pederastia ou outro" e "homossexual ou não", expressos no dispositivo do CPM.
A ADPF, ajuizada pela Procuradoria Geral da República, alegava violação aos princípios da isonomia, liberdade, dignidade da pessoa humana, pluralidade e do direito à privacidade, e pedia que fosse declarada a não recepção do dispositivo pela Constituição de 1988. Mas também, subsidiariamente, pedia a declaração de inconstitucionalidade do termo “pederastia” e da expressão “homossexual ou não” na tipificação penal. Para a PGR, a norma impugnada, um decreto-lei de 1969, foi editada no contexto histórico de um regime militar ditatorial, marcado pelo autoritarismo e pela intolerância às diferenças.
O ministro Luís Roberto Barroso, relator do processo, apresentou voto, inicialmente, pela integral procedência do pedido da PGR. Para o ministro, a redação do artigo 235 do Código Penal Militar criminaliza o sexo consensual entre adultos, desde que ocorram em duas circunstâncias: o agente seja militar e o ato ocorra em lugar sujeito à administração militar. Barroso citou que, na literalidade, o dispositivo criminaliza tanto atos homossexuais como heterossexuais. “A prática de ato sexual ou de atos libidinosos, ainda que consensuais, no local de trabalho, pode e frequentemente constituirá conduta imprópria, seja no ambiente civil ou militar, e no direito é um comportamento sancionado. No direito do trabalho, por exemplo, permite-se a rescisão do contrato de trabalho por justa causa nessa hipótese, portanto não está em discussão a possibilidade de se sancionar questão de conduta imprópria no local de trabalho e sim a natureza e o grau da sanção”, disse o ministro.
Barroso destacou ainda que há, no dispositivo impugnado do Código Militar, uma criminalização excessiva e citou que o direito penal constitui o último e mais drástico instrumento a ser utilizado pelo Estado. “A criminalização das condutas só deve ocorrer quando seja necessário, e quando não seja possível, proteger adequadamente o bem jurídico por outra via. Esse é o princípio da intervenção mínima do direito penal”.
Contudo, a maioria dos ministros entendeu que o tipo penal deveria ser mantido, desde que invalidadas as expressões “pederastia ou outro” e “homossexual ou não”, constantes no tipo penal, uma vez que têm caráter discriminatório. Assim, o relator alinhou-se ao entendimento majoritário, votando pela parcial procedência da ação.
O ministro Marco Aurélio, que também votou pela procedência parcial da ADPF, ressaltou que o STF tem atuado com “muita temperança” quando em jogo a disciplina normativa militar, destacando que o artigo 235 do CPM visa proteger a administração militar, a disciplina e a hierarquia. Contudo, segundo ele, as expressões “pederastia” e “homossexual ou não”, constantes no tipo penal, ofendem direitos fundamentais. Para ele, não seria o caso de se declarar a não recepção da norma na sua íntegra, mas apenas afastar as expressões que revelam postura discriminatória.
Ficaram vencidos na votação os ministros Celso de Mello e Rosa Weber, que julgavam integralmente procedente a ação. Fonte: STF
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