Reza o art. 496 do CC que: “É anulável a venda de ascendente a descendente, salvo se os outros descendentes e o cônjuge do alienante expressamente houverem consentido”. Como se pode notar, há uma disciplina específica para a compra e venda celebrada entre ascendentes e descendentes, a exigir todo o nosso cuidado. Neste particular, houve uma importante mudança, isto porque o CC/16 qualificava a venda de ascendente por descendente em negócio jurídico nulo. Há, pois, sob o ponto de vista comparativo entre os códigos civis brasileiros, de modo que na atualidade o vício é considerado como de menor potencial lesivo (anulabilidade).
De acordo com a norma, a validade do contrato de compra e venda entre ascendente e descendente exigirá autorização expressa dos demais descendentes, bem como do cônjuge do alienante. Acaso isto não aconteça, a consequência jurídica será a nulidade relativa a autorizar o ajuizamento de uma ação anulatória no prazo decadencial de dois anos, na forma do art. 179 do CC.
Atenção!
Aplica-se a regra do art. 496 do CC para o caso de dação em pagamento isto porque o art. 357 do CC de forma expressa assim determina: “determinado o preço da coisa dada em pagamento, as relações entre as partes regular-se-ão pelas normas do contrato de compra e venda”.
Interessante analisar se a regra do art. 496 do CC se aplicaria – por analogia e isonomia – à união estável. Sobre o tema, a doutrina diverge. Há dois posicionamentos, como afirmam Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald[1]:
Posicionamento 1 (negativista, pela não aplicabilidade) – não se aplicaria a regra em destaque tendo em vista a ausência de risco hereditário na união estável na medida em que o companheiro sobrevivente não é herdeiro necessário, a par do fato de que normas restritivas de direito merecem interpretação estrita (CC, art. 114). Neste sentido, Flávio Tartuce e José Osório de Azevedo Júnior.
Posicionamento 2 (afirmativista, pela aplicabilidade) – a regra do art. 496 do CC se aplica por simetria à união estável por ser entidade familiar protegida pela Constituição Federal, à luz da igualdade (CF/88, art. 5º, I e 226, §3º). Neste sentido, Paulo Luiz Netto Lôbo.
Destarte, mesmo em havendo a capacidade jurídica geral ou plena, impõe-se, por força da lei, uma autorização. Trata-se de mais uma casuística de legitimação no Código Civil. Evidentemente, que esta autorização há de ser expressa, de modo que o silêncio não presume aceitação como regra geral, a teor do artigo 111 do Código Civil.
O Código dispensa a necessidade da outorga caso o regime seja de separação obrigatória. A ideia é simples. Neste caso, falta potencialidade lesiva sucessória a exigir a autorização. Em uma interpretação sistemática, pode-se falar ainda na desnecessidade de autorização do cônjuge quando casado em regime de participação final nos aquestos e o pacto, expressamente, dispensar tal autorização (art. 1656 do CC).
O que fazer se houver a alienação sem a referida outorga?
A hipótese será de anulabilidade, a qual há de ser pleiteada no prazo decadencial de dois anos, contados da conclusão do contrato, na forma do art. 179 do Código Civil. No particular, verifica-se que a Súmula 494 do Supremo Tribunal Federal caducou, pois firmava entendimento no sentido de que o prazo em tela seria prescricional e de 20 (vinte) anos, o que é incompatível com a legislação cível atual. É o que pensam Paulo Luiz Netto Lôbo, Maria Helena Diniz, José Simão e Flávio Tartuce.
Sobre o tema, o Enunciado 545 do CJF afirma que o prazo de dois anos é contado da ciência do ato, a qual é presumida na data do registro da transmissão do imóvel. Tal tese, registra-se, é doutrinária, isto porque o prazo na ótica da legislação do Código Civil deve ser contado da conclusão do ato. O Enunciado 368 do CJF afirma que “o prazo para anular venda de ascendente para descendente é decadencial de dois anos”. Assim também já entende o Superior Tribunal de Justiça, no REsp. 771.736-0/SC.
No que diz respeito ao ônus da prova o Superior Tribunal de Justiça assentou o entendimento no sentido de que há ônus da prova do autor da demanda de comprovar o prejuízo alegado, sob pena de não se obter a anulação. Neste sentido, a Segunda Seção da Corte da Cidadania no julgamento do EREsp. 661.858/PR uniformizou o entendimento no sentido que tal anulabilidade “depende da demonstração de prejuízo pela parte interessada”. No mesmo sentido o REsp. 752.149/AL.
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[1] FARIAS, Cristiano Chaves de, e ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil. Contratos. 5ª Edição. São Paulo: Atlas, 2015, p. 609.