O professor Rogério Sanches Cunha disponibilizou gratuitamente um caderno de atualizações dos seus livros Manual de Direito Penal (parte geral e especial) e Código Penal Comentado. Nele constam todas as mudanças ocorridas no primeiro semestre de 2016 – doutrina, jurisprudência e legislação. Divulgaremos as atualizações aqui para vocês. Tema de hoje: Justiça Restaurativa, Justiça Reparatória e Justiça Negociada.
São, basicamente, três os modelos de resposta ao cometimento de um crime:
a) Dissuasório clássico: inspirado pela ideia de retribuição, consiste na simples imposição de pena, medida suficiente para retribuir o mal causado pela prática criminosa e para evitar o cometimento de novos delitos;
b) Ressocializador: tem a finalidade de reintegrar o delinquente à sociedade (prevenção especial positiva);
c) Consensuado: tem o propósito de trazer à Justiça criminal modelos de acordo e conciliação que visem à reparação de danos e à satisfação das expectativas sociais por justiça. Pode ser dividido em (1) modelo pacificador ou restaurativo, voltado à solução do conflito entre o autor do crime e a vítima (reparação de danos) e (2) modelo de justiça negociada (plea bargaining), em que o agente, admitindo a culpa, negocia com o órgão acusador detalhes como a quantidade da pena, a forma de cumprimento, a perda de bens e também a reparação de danos.
Vê-se, especialmente pela introdução do modelo de Justiça consensual, que a resposta para o crime tem sofrido o influxo de novas ideias, voltadas para uma solução cada vez menos retributiva (meramente punitiva) e mais construtiva (reparadora).
Nesse contexto, têm adquirido importância no cenário jurídico- -penal as Justiças Restaurativa, Reparatória e Negociada.
A primeira, baseada num procedimento de consenso envolvendo os personagens da infração penal (autor, vítima e, em alguns casos, a própria comunidade), sustenta que, diante do crime, sua solução perpassa pela restauração, ou seja, pela reaproximação das partes envolvidas para que seja restabelecido o cenário anterior (de paz e higidez das relações sociais). Representa um rompimento com a tradicional “usurpação”, pelo Estado, da relação vítima-infrator, possibilitando o surgimento de uma nova perspectiva que quebra a dualidade da função da pena, até então restrita à retribuição e à prevenção, incluindo a restauração como nova possibilidade5.
Neste modelo, a solução do conflito não é promovida diretamente pelo órgão de justiça criminal, mas por um integrante de um órgão específico de mediação.
Já a Justiça Reparatória se faz por meio da conciliação promovida pelos órgãos integrantes do sistema criminal, como ocorre na transação penal (Lei no 9.099/95) e nos termos de ajustamento de conduta para a reparação dos danos ambientais nas infrações da Lei no 9.605/98. A Lei no 11.719/08 (que alterou o CPP) confirma essa tendência a partir do momento em que permite ao juiz, na sentença condenatória, fixar valor mínimo indenizatório à vítima.
Por fim, na Justiça Negociada, proveniente sobretudo do direito americano, o agente e o órgão acusador acordam acerca das consequências da prática criminosa, o que, evidentemente, pressupõe a admissão de culpa. Trata-se do denominado plea bargaining, que pode consistir na negociação sobre a imputação (charge bargaining), sobre a pena e todas as consequências do delito, como o perdimento de bens e a reparação de danos (sentence bargaining), ou sobre ambas. Não se identifica esta liberdade de acusação no sistema jurídico brasileiro, em que o órgão do Ministério Público tem atuação vinculada ao conjunto probatório proveniente da investigação, ou seja, a imputação deve ser estritamente relativa ao crime demonstrado. Além disso, a pena é aplicada por decisão exclusiva do juiz, sem possibilidade de influência direta do órgão acusador.
É possível, ainda no âmbito da Justiça Negociada, que o agente seja beneficiado em virtude da relevância de sua colaboração, como na situação em que o componente de uma organização criminosa aponta os demais agentes e revela detalhes de suas atividades delituosas, permitindo o desmantelamento da estrutura, a recuperação de bens e ativos, a libertação de vítimas em sequestros etc. Este sistema é aplicado no Brasil por meio de diversos diplomas legais, dentre os quais se destaca a Lei no 12.850/13, que, no art. 4º, dispõe:
“O juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal, desde que dessa colaboração advenha um ou mais dos seguintes resultados:
I – a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas;
II – a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa;
III – a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa;
IV – a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa;
V – a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada”.
Para baixar o caderno completo, clique aqui.
Livros que foram atualizados: Manual de Direito Penal (parte geral); Manual de Direito Penal (parte especial); Código Penal Comentado
Cursos que o prof. Rogério Sanches ministra aulas:
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