Recentemente houve mudanças nos direitos dos consumidores que utilizam serviços aéreos previstos nas novas normas da Anac. Esses direitos precisam ser conhecidos pelos consumidores a fim de que sejam evitados abusos, que sejam utilizados em sua plenitude e que esses sejam cumpridos pelas prestadoras de serviços aéreos.
Trazemos aqui as principais mudanças previstas na Resolução da Anac n. 400/2016, que dispõe sobre as Condições Gerais de Transporte Aéreo. Para melhor compreensão das novas regras, se faz necessário trazer a lume o significado dos termos utilizados, observe:
– preterição de embarque: Trata-se do embarque não realizado por motivo de segurança operacional, troca de aeronave, overbooking etc. Ou seja, a preterição se dá quando o consumidor não consegue embarcar mesmo tendo cumprido todos os requisitos para o embarque, como chegar ao aeroporto com 1 hora de antecedência para os voos nacionais e 1h30min para os voos internacionais.
– direitos especiais de saque (DES): O DES é uma unidade de medida de valor criada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) que oscila de acordo com a variação de algumas moedas internacionais. Para saber quanto vale um DES, consulte o site do Banco Central, no link de conversão de moeda2, coloque como moeda a ser convertida o “Direito Especial/SDR” para Real e terá o valor unitário da DES bem como o valor total convertido em Reais.
– bagagem despachada: Também chamada de bagagem de porão, é aquela entregue pelo passageiro no balcão da companhia aérea, normalmente no momento do check-in, e que será transportada no compartimento de carga da aeronave.
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Dito isso, passamos a elencar as principais mudanças operadas na esfera do direito dos passageiros:
Indenização imediata no caso de preterição de embarque
Na impossibilidade de embarque por motivos que não são de responsabilidade do passageiro, a empresa aérea deverá indenizá-lo, imediatamente, no valor de 250 (duzentos e cinquenta) DES para voos nacionais, e 500 (quinhentos) DES para voos internacionais. Tal indenização pode ser realizada através de transferência bancária, voucher ou em espécie. A empresa aérea pode condicionar o pagamento dessa compensação à assinatura de termo de aceitação específico pelo consumidor.
O pagamento dessa indenização obrigatória e companhia aérea continua responsável de oferecer ao consumidor opções para colocá-lo em outro voo, não impedindo o reembolso integral do valor pago pela passagem ou a execução do serviço por outra modalidade de transporte. Todavia, ocorrendo overbooking (mais passageiros do que o número de assentos disponíveis), a resolução prevê que o consumidor que aceitar voluntariamente ser reacomodado em outro voo não terá direito à indenização devida para o caso de preterição.
Prazo para reembolso
Existindo necessidade do reembolso, seja em decorrência de cancelamento de voo ou extravio de bagagem, o prazo para ser realizado será de sete dias, para viagens nacionais ou internacionais. Em cancelamento de voo, o prazo se inicia a partir da solicitação do passageiro. Nos casos de extravio ou danificação de bagagem tal prazo se inicia após o tempo que a companhia aérea tem para tentar localizar a mala perdida ou reparar os danos aos pertences, que é de sete dias no caso de voos nacionais, e de 21 dias nos internacionais.
A resolução prevê que o reembolso dependerá da forma como foi feito o pagamento, mas não especifica quais seriam as condições para tanto. O Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) considera que se o consumidor pagou a passagem à vista, o reembolso deve ser realizado de uma vez e imediatamente (no prazo de cinco dias). Já se o pagamento foi parcelado, a devolução terá de ser negociada com a empresa.
A companhia aérea também poderá ofertar créditos para aquisição de outra passagem (voucher), mas é facultado ao consumidor aceitar essa opção. Caso o passageiro aceite créditos para aquisição de passagens, deve ser fornecido um voucher ou outro documento por escrito com a data de validade dos créditos e assegurada a sua livre utilização, inclusive para a aquisição de passagem aérea para terceiros.
Direito de arrependimento rápido
No caso de compra da passagem pela internet, a resolução da Anac prevê a possibilidade de cancelamento em até 24 horas, sem qualquer custo, desde que o bilhete tenha sido adquirido com antecedência mínima de sete dias da data do embarque. A regra é bem mais restritiva do que o direito de arrependimento previsto no art. 49, do CDC, que prevê a possibilidade de desistir de compras feitas fora do estabelecimento comercial em até sete dias.
Limite das multas
As companhias aéreas não poderão mais cobrar multas contratuais superiores ao valor da passagem. As empresas ainda podem ficar com todo o valor que o consumidor pagou caso ele desista da viagem, remarque a data ou perca o voo – já que o limite para a multa é de 100%. Ressalte-se que é necessário que o consumidor tome ciência das regras para cancelamento de passagem antes de comprá-las, pois as condições mudam de acordo com o tipo de tarifa. Em geral, tarifas mais baratas têm multas mais altas para cancelamento.
Remarcação de passagem
Em caso de remarcação de passagem, o consumidor poderá pagar ou receber a variação tarifária. Essa variação não tem a ver com multa: trata-se da diferença de preço entre a passagem cancelada e a nova passagem adquirida. Se a diferença for positiva sendo a nova passagem mais barata, o consumidor deverá ser reembolsado; e se for negativa, passagem mais cara, o passageiro terá de pagar essa diferença.
Assistência material
A companhia aérea é obrigada a prestar assistência ao passageiro em caso de atrasos, cancelamentos e preterição de voos, ou de interrupção do serviço (p. ex. fechamento do aeroporto), mesmo que os passageiros já estejam dentro da aeronave. A assistência deve ser oferecida de forma gratuita e depende do tempo de espera para partida prevista: 1 hora de atraso: facilitar comunicação, como fornecer acesso à internet ou telefone; 2 horas de atraso: fornecer alimentação, de acordo com o horário, seja oferecendo diretamente a refeição ou um voucher individual para consumo em outro local; e, 4 horas de atraso: serviço de hospedagem, em caso de pernoite, e traslado de ida e volta do aeroporto.
A oferta de hospedagem não é obrigatória, caso o consumidor resida na localidade do aeroporto, no entanto, o traslado de ida e volta deve ser oferecido pela empresa aérea. Para passageiros com necessidade de assistência especial e seus acompanhantes, a hospedagem deverá ser fornecida independentemente da exigência de pernoite no local. A hospedagem poderá ser substituída por acomodação em local que atenda às suas necessidades, se o passageiro concordar. A assistência material deve ser prestada independentemente de a companhia aérea ser “culpada” pelo problema que causou a preterição do voo. Sendo-lhe vedada a alegação de casos fortuitos ou força maior para se eximir da assistência.
Extravio de bagagem: ressarcimento de despesas e limite de indenização
Os consumidores que estiverem fora do seu domicílio têm direito a ressarcimento de eventuais despesas no período que a companhia aérea tem para localização da mala extraviada – sete dias em voo nacional, ou 21 dias no internacional. A resolução não prevê limite diário para tais despesas, nem a forma de ressarcimento. Cada companhia aérea pode estipular suas regras em contrato. Contudo, a Anac autorizou as empresas a descontarem essas despesas do valor final a ser ressarcido caso a mala não seja localizada. Em relação ao valor da indenização caso a mala não seja encontrada, a resolução criou uma limitação de indenização no valor de 1.131 Direitos Especiais de Saque (DES). Utilizando a cotação vigente em março de 2017 para essa unidade monetária, o consumidor teria direito a ser ressarcido em no máximo R$ 4.476,47.
Neste ponto, o Idec considera que essa limitação é ilegal, pois os arts. 186 e 927, da lei civil e o art. 14, do CDC preveem reparação integral dos danos sofridos. Na aparente tentativa de amenizar essa ilegalidade, a resolução da Anac prevê a possibilidade do consumidor declarar o valor da bagagem e, assim, aumentar a indenização em caso de extravio ou violação. Porém, a norma não diz que essa declaração é gratuita, então a empresa aérea pode cobrar por esse serviço.
No que tange aos objetos de valor (joias, dinheiro em espécie e eletroeletrônicos) não podem ser incluídos na declaração. Dessa forma, é recomendado que sejam transportados na bagagem de mão. Para os demais itens despachados na bagagem, devem ser guardadas as notas fiscais de compra, e documentados a fim de comprovar e facilitar a indenização em caso de extravio ou violação.
Volta garantida
A nova norma proíbe o cancelamento automático do voo de volta caso o passageiro que comprou ida e volta juntas tenha perdido o primeiro trecho. A volta não poderá ser cancelada desde que o consumidor comunique à empresa aérea que não vai comparecer até o horário originalmente contratado do voo de ida.
Franquias: bagagem de mão e despachada
A franquia da bagagem de mão deve ser e no mínimo 10 kg. As empresas aéreas podem estipular no contrato a quantidade de volumes que o consumidor poderá levar como bagagem de mão, bem como as dimensões a serem transportadas. Não há mais obrigatoriedade de franquia de bagagem despachada, tanto para os voos nacionais quanto para os internacionais. Cada empresa aérea terá liberdade para estipular como funcionará a cobrança pela bagagem despachada.
No entanto, o fim da franquia de bagagem despachada está sendo discutida no Judiciário. Há também um Projeto de Decreto Legislativo proposto e aprovado pelo Senado que pretende suspender a norma, mas que ainda não foi apreciado pela Câmara dos Deputados. No entanto, a decisão liminar que suspendia os efeitos da resolução da Anac foi derrubada pela Justiça Federal do Ceará, o que demanda que o consumidor fique atento e prepare-se para todas as mudanças.
Menciona-se que além de pesquisar o preço da passagem, agora o consumidor também terá de pesquisar como a companhia aérea oferta a bagagem despachada e precisará estimar a quantidade e peso das malas que vai despachar tanto na ida quanto na volta para escolher um serviço que atenda melhor às suas necessidades.
Fonte: <http://www.idec.org.br/pagarpelabagagem/novas-regras-anac_idec.pdf>.
Sobre Cristiano Sobral
Cristiano Sobral é doutorando em Direito. Professor de Direito Civil e Direito do Consumidor na FGV, na Associação do Ministério Público do Rio de Janeiro, na Fundação Escola da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, na Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, no Complexo de Ensino Renato Saraiva e na Fundação Escola do Ministério Público do Rio de Janeiro. Professor universitário, palestrante e autor de diversas obras jurídicas.
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